O mercado de trabalho do cibercrime está a utilizar a promessa de rendimentos elevados para recrutar uma nova geração, cada vez mais jovem, uma verdadeira armadilha da Dark Web. Um relatório da Kaspersky alerta que a média de idade dos candidatos é de apenas 24 anos, com uma presença expressiva de menores.

A presença de jovens na Dark Web em busca de oportunidades de “emprego” está a aumentar de forma alarmante, impulsionada pela miragem do dinheiro fácil e rápido. A análise da Kaspersky Digital Footprint Intelligence, intitulada “Inside the dark web job market: Their talent, our threat”, revela que o número de currículos e vagas em fóruns clandestinos duplicou no primeiro trimestre de 2024 face ao mesmo período de 2023, mantendo-se estável no início de 2025.
Este crescimento é sustentado por uma força de trabalho jovem. Este ano, a oferta de candidatos (55% dos currículos) supera o número de vagas disponíveis (45%), um fenómeno que a Kaspersky atribui às ondas de despedimentos globais e ao influxo de jovens atraídos pela aparente facilidade de entrada neste mercado paralelo.
A armadilha da Dark Web: o preço da ilusão (Dinheiro vs. Risco)
A remuneração é o principal chamariz. As expectativas salariais variam significativamente:
- Engenheiros de engenharia inversa: São os mais bem remunerados, com médias superiores a 5.000 dólares mensais.
- Testers de intrusão: Auferem cerca de 4.000 dólares mensais.
- Programadores: Recebem aproximadamente 2.000 dólares.
Em atividades diretamente ligadas ao cibercrime, o pagamento baseia-se em percentagens da receita: os “traffers” (que direcionam vítimas para sites maliciosos) podem receber 50% do total, enquanto “carders” e branqueadores de capitais auferem cerca de 30% e 20%, respetivamente. Estes valores evidenciam o prémio associado a competências escassas e de elevado impacto neste ecossistema.
Alexandra Fedosimova, analista da Kaspersky, adverte que este mercado “está a absorver os desempregados, os menores de idade e os sobrequalificados” com a falsa premissa de que funciona como o mercado legal, mas com vantagens como ofertas em 48 horas e sem entrevistas. “Poucos percebem que trabalhar na Dark Web pode levar à prisão”, alerta.
Um ecossistema criminoso que atrai jovens na Dark Web
O relatório desmonta a ideia de um cibercrime amador e mostra como este ecossistema está organizado para atrair e utilizar jovens na Dark Web. Embora algumas ofertas sejam para trabalhos legítimos, a maioria está associada a atividades ilícitas. As vagas publicadas refletem uma economia organizada:
- Programadores (17%): Criam ferramentas de ataque.
- Testers de intrusão (12%): Investigam redes em busca de pontos fracos.
- Branqueadores de capitais (11%): Limpam fundos ilícitos.
- Carders (6%): Roubam e monetizam dados de pagamento.
- Traffers (5%): Levam vítimas a sites de phishing ou downloads infetados.
Um dado alarmante é que 69% dos candidatos não especificam uma área de interesse, demonstrando disponibilidade para realizar qualquer tarefa remunerada.
A equipa da Kaspersky observou ainda padrões de género: as candidatas tendem a procurar funções interpessoais (apoio, call center), enquanto os candidatos masculinos focam-se em funções técnicas e crimes financeiros (programadores, mulas de dinheiro).
Recomendações de segurança
O relatório sublinha a urgência de educadores e pais dialogarem com os jovens sobre as consequências legais e reputacionais irreversíveis destas atividades. A Kaspersky destaca o projeto “What we should do with kids who hack” para reorientar adolescentes para o uso ético das suas competências.
A empresa apresenta recomendações claras: A nível individual:
- Não seguir links suspeitos nem responder a ofertas de “dinheiro fácil” não solicitadas.
- Verificar a legitimidade das vagas em canais oficiais.
- Adolescentes devem denunciar publicações suspeitas aos pais ou autoridades.
Nas organizações:
- Formar colaboradores para reconhecer phishing.
- Implementar monitorização da Dark Web para detetar credenciais e currículos de ex-trabalhadores.
- Capacitar os RH para detetar “experiência sombra”.
- Tornar obrigatória a deteção de fraude em múltiplas camadas, dado que funções como mulas e carders são portas de entrada para ataques maiores.
Conclusão
O relatório da Kaspersky lança um alerta sério sobre a profissionalização do cibercrime e a sua capacidade de atrair uma força de trabalho jovem e vulnerável. A combinação de promessas salariais elevadas com a falsa sensação de impunidade na Dark Web cria uma armadilha perigosa, que exige uma resposta concertada entre a educação, as famílias e as organizações. A prevenção e a reorientação de competências tecnológicas para caminhos éticos são fundamentais para combater esta tendência crescente.
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