Até agora, as redes sociais têm sido um espelho, por vezes distorcido, da nossa realidade. Partilhamos vídeos das nossas férias, fotos dos nossos amigos, momentos do nosso dia a dia. A OpenAI, a empresa por trás do ChatGPT e do revolucionário gerador de vídeo Sora, está prestes a quebrar esse espelho. Foi anunciado que a empresa se prepara para lançar uma aplicação social independente que, à primeira vista, se parece e se comporta como o TikTok, mas com uma diferença fundamental e alucinante: nada do que vês é real.
A nova aplicação, alimentada pelo modelo de vídeo de nova geração Sora 2, será uma plataforma de vídeos verticais onde todo o conteúdo, sem exceção, é gerado por inteligência artificial. Não será permitido o upload de vídeos ou fotos pessoais. É uma aposta radical num futuro onde o entretenimento social não se baseia em partilhar a realidade, mas sim em criá-la a partir do nada com o poder de uma simples descrição de texto.
Como vai funcionar esta “rede social sintética”?
A experiência será familiar para qualquer utilizador do TikTok. Terás um feed vertical infinito de vídeos curtos (limitados a 10 segundos), que podes percorrer deslizando o dedo. Um algoritmo de recomendação irá personalizar o feed “Para Ti”, aprendendo com os teus gostos. Poderás gostar, comentar e, crucialmente, “remisturar” os vídeos que vês, usando-os como ponto de partida para as tuas próprias criações.
A grande diferença está no processo de criação. Em vez de um botão para gravar, terás uma caixa de texto. Descreves a cena que imaginas, e o Sora 2 – uma versão melhorada do modelo original, agora com simulação de física mais realista, movimentos humanos mais coerentes e a capacidade de gerar áudio integrado, como vozes e sons ambiente – irá criar um vídeo de 10 segundos a partir da tua descrição.

Tu, mas em versão IA: a verificação de identidade
Talvez a funcionalidade mais futurista e controversa seja a de verificação de identidade. A aplicação irá permitir que verifiques a tua aparência, autorizando que a tua imagem seja usada como um “ator digital” dentro do ecossistema.
Isto significa que poderás criar vídeos onde tu és o protagonista, ou os teus amigos poderão incluir-te nas suas criações sintéticas. Para evitar o uso indevido, a OpenAI implementou uma salvaguarda importante: serás notificado sempre que a tua imagem for usada por outra pessoa, mesmo que seja apenas num rascunho de um vídeo que ainda não foi publicado. É um primeiro e ousado passo na gestão da identidade digital na era dos deepfakes.
A bomba-relógio dos direitos de autor
Se a gestão da identidade pessoal é complexa, a dos direitos de autor é uma autêntica bomba-relógio. A abordagem da OpenAI a este problema promete gerar uma enorme controvérsia. A empresa irá implementar um sistema de opt-out.
Isto significa que, por defeito, o Sora 2 pode ser treinado e pode gerar conteúdo baseado em material protegido por direitos de autor. A responsabilidade é transferida para os criadores, artistas e estúdios, que terão de monitorizar ativamente a plataforma e solicitar a exclusão do seu trabalho. Os críticos argumentam que este sistema é insustentável e que coloca um fardo injusto sobre os detentores dos direitos. A única exceção serão as figuras públicas, cujas imagens não poderão ser recriadas sem permissão.
O que significa isto para o futuro das redes sociais?
O lançamento desta aplicação é mais do que a estreia de um novo produto; é um ponto de viragem. Desafia a própria definição de “rede social”. Se uma plataforma é composta inteiramente por conteúdo sintético, ainda é “social”? Ou é uma nova forma de entretenimento colaborativo?
A aposta da OpenAI é um ataque direto ao domínio do TikTok, surgindo num momento de grande escrutínio geopolítico sobre a plataforma chinesa. Ao criar uma alternativa totalmente sintética e sediada nos EUA, a OpenAI não está apenas a inovar tecnologicamente; está a fazer uma jogada geopolítica.
Esta nova aplicação será um teste em tempo real a algumas das questões mais prementes da nossa era: a linha que separa o real do artificial, o conceito de identidade numa era de avatares digitais e a batalha pela propriedade intelectual no mundo da IA generativa. O futuro do entretenimento está a ser escrito, e parece ser muito, muito estranho.
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