Lembras-te do final de 2019? Elon Musk subiu a um palco para revelar um veículo que parecia ter sido arrancado de um filme de ficção científica. O Tesla Cybertruck, com o seu design angular em aço inoxidável e a promessa de um futuro elétrico e blindado, tornou-se um fenómeno instantâneo, simbolizado pelo famoso (e embaraçoso) vidro estilhaçado. Seis anos depois, a realidade é muito menos glamorosa. O Cybertruck é, segundo todos os indicadores, um fracasso comercial no seu principal mercado, os Estados Unidos.
Agora, numa tentativa clara de encontrar novos compradores e de dar uso a uma capacidade de produção largamente subutilizada, a Tesla anunciou oficialmente o lançamento do seu camião elétrico em novos mercados: a Arábia Saudita e o Qatar. Esta expansão para o coração do mundo petrolífero é mais do que uma simples jogada de negócio; é a admissão implícita de que o sonho americano do Cybertruck falhou, e que o seu futuro pode residir em ser um brinquedo exótico para os ultrarricos.
A brutal realidade dos números
Para entender a profundidade do problema do Cybertruck, basta olhar para os números. Na altura do seu anúncio, o veículo acumulou mais de 1 milhão de pré-reservas, e a Tesla preparou uma capacidade de produção de 250.000 unidades por ano, com Elon Musk a acenar com a possibilidade de a aumentar para 500.000. O futuro parecia brilhante.
No entanto, quando a versão de produção foi finalmente revelada, as duas promessas mais importantes tinham sido quebradas: o preço era muito mais alto do que o anunciado inicialmente, e a autonomia era significativamente menor. A procura evaporou-se. Hoje, a Tesla luta para vender cerca de 25.000 unidades por ano – apenas um décimo da sua capacidade de produção planeada.
Com as linhas de montagem praticamente paradas, a única solução viável para a Tesla é procurar novos mercados. E a escolha desses mercados diz tudo sobre o novo posicionamento do Cybertruck.

A aposta no luxo e no petróleo
Nos últimos meses, a Tesla tem vindo a expandir a disponibilidade do Cybertruck para mercados selecionados fora da América do Norte. Primeiro a Coreia do Sul, depois os Emirados Árabes Unidos e, agora, a Arábia Saudita e o Qatar. O padrão é claro: são mercados com um enorme poder de compra e uma cultura onde a ostentação automóvel é uma parte importante da identidade.
Na Arábia Saudita, o Cybertruck terá um preço inicial de 435.000 riais, o equivalente a cerca de 116.000 dólares. A este preço, o Cybertruck deixa de ser o veículo de trabalho futurista que foi prometido para se tornar num símbolo de estatuto, um objeto de design radical que grita “eu sou diferente e tenho dinheiro para o provar”.
A ironia de vender um veículo elétrico em países cuja economia é construída sobre o petróleo não passa despercebida. Estes não são mercados onde a transição energética é o principal motor de compra. São mercados onde a exclusividade e a novidade reinam, e onde, como indicam os relatórios, muitos indivíduos abastados já tinham importado Cybertrucks a título privado, muito antes do seu lançamento oficial.
Será isto suficiente para salvar o Cybertruck?
Esta expansão internacional irá, sem dúvida, dar um pequeno impulso às vendas. Analistas preveem que estes novos mercados possam aumentar o volume de vendas em cerca de 20% ao longo do próximo ano. É um balão de oxigénio, mas está longe de ser uma cura.
Um aumento de 20% sobre as 25.000 unidades anuais significa apenas mais 5.000 veículos vendidos. É um número que mal arranha a superfície da capacidade de produção da Tesla e que não resolve o problema fundamental do programa Cybertruck: o produto que está a ser vendido não é o produto que as pessoas queriam comprar em 2019.
A expansão para o Médio Oriente é, na sua essência, um “band-aid” numa ferida profunda. É uma forma de mitigar as perdas e de dar algum uso a uma fábrica dispendiosa. A única coisa que poderá verdadeiramente “salvar” o Cybertruck, segundo os analistas, seria o lançamento de uma segunda geração que consiga, finalmente, aproximar-se das promessas originais de preço e autonomia que geraram o entusiasmo inicial.
Até lá, o percurso do Cybertruck serve como uma lição de humildade para a Tesla. O veículo que nasceu para ser uma revolução para as massas está, por agora, relegado a ser uma curiosidade de luxo para uma elite global.
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