As Encefalopatias Espongiformes Transmissíveis (TSEs) são um grupo raro e fatal de doenças neurodegenerativas que afetam tanto humanos quanto animais.
Elas são causadas por proteínas anormais e mal dobradas chamadas príons. Esses príons podem desencadear uma reação em cadeia no cérebro, convertendo proteínas saudáveis em formas patológicas, o que leva a danos cerebrais e rápida deterioração cognitiva.

Ao contrário de vírus ou bactérias, os príons não estão vivos e não contêm material genético. Sua natureza única os torna altamente resistentes a métodos convencionais de tratamento.
No entanto, com os avanços da ciência e da tecnologia, os pesquisadores estão desenvolvendo terapias de próxima geração com o objetivo de parar ou retardar a progressão das TSEs.
Este artigo explora, da MyBioSource, como avanços em biotecnologia, engenharia genética, nanotecnologia e design de fármacos estão criando novas possibilidades para tratar doenças priônicas que antes eram consideradas intratáveis.
Entendendo o Mecanismo do Príon
No centro das TSEs está o mau dobramento da proteína priônica. A versão normal dessa proteína, chamada PrP^C, é encontrada em todo o corpo, especialmente no cérebro. Ela desempenha um papel na sinalização celular e pode ajudar a proteger os neurônios.
No entanto, quando essa proteína se dobra incorretamente em uma forma anormal conhecida como PrP^Sc, ela se torna tóxica e infecciosa. Essa proteína alterada pode induzir outras proteínas normais a também se dobrarem incorretamente, desencadeando um efeito em cascata.
O acúmulo dessas proteínas anormais leva à formação de buracos semelhantes a esponjas no tecido cerebral, causando sintomas como perda de memória, mudanças de personalidade, dificuldades motoras e, eventualmente, a morte. Doenças como a Doença de Creutzfeldt-Jakob em humanos, a Encefalopatia Espongiforme Bovina em bovinos e o scrapie em ovelhas são exemplos de TSEs.
O Desafio de Tratar as TSEs
Uma das razões pelas quais as TSEs são tão difíceis de tratar é a resiliência dos príons. Eles não são destruídos por calor, radiação ou pela maioria dos desinfetantes químicos. Além disso, sua capacidade de se propagar sem ácidos nucleicos torna ineficazes os antivirais e antibióticos. Isso levou os pesquisadores a buscar estratégias mais sofisticadas, utilizando ferramentas avançadas para alvejar diretamente o processo de mau dobramento e propagação das proteínas.
Terapias Genéticas e Silenciamento Gênico
A terapia genética oferece uma abordagem poderosa ao atacar a origem do problema: o gene PRNP, que codifica a proteína priônica normal. Reduzir a expressão desse gene pode potencialmente interromper a produção da proteína necessária para a replicação dos príons.
Cientistas usaram a ferramenta de edição genética CRISPR-Cas9 para remover ou alterar o gene PRNP em modelos laboratoriais. Animais que não possuem esse gene demonstraram resistência a infecções priônicas, sugerindo que a redução dos níveis de PrP^C pode ser uma medida preventiva eficaz.
Outro método promissor é o uso de oligonucleotídeos antisenso, ou ASOs. Essas pequenas moléculas de DNA ou RNA ligam-se ao RNA mensageiro do gene PRNP, bloqueando a produção das proteínas priônicas. Estudos iniciais com ASOs em camundongos mostraram redução nos níveis de príons e aumento na sobrevida. Ensaios clínicos em humanos ainda estão em estágios iniciais, mas os resultados preliminares são encorajadores.
Imunoterapia com Anticorpos Monoclonais
Anticorpos monoclonais são proteínas projetadas para se ligarem especificamente a certos alvos no corpo. No caso das doenças priônicas, esses anticorpos podem ser feitos para se ligarem tanto à forma normal quanto à forma mal dobrada da proteína priônica.
Ao se ligarem à PrP^Sc, esses anticorpos podem ajudar o sistema imunológico a reconhecer e eliminar as proteínas anormais. Alguns anticorpos experimentais tiveram sucesso em retardar o início dos sintomas em animais infectados. No entanto, a entrega desses anticorpos ao cérebro é um grande desafio devido à barreira hematoencefálica, que limita a passagem de substâncias do sangue para o cérebro.
Pesquisadores estão trabalhando em anticorpos capazes de atravessar essa barreira ou em métodos de administração direta no líquido cefalorraquidiano, onde podem agir com mais eficácia sobre o tecido cerebral.
Inibidores de Pequenas Moléculas e Estabilizadores de Proteínas
Outra área promissora é o desenvolvimento de pequenas moléculas capazes de estabilizar a proteína priônica normal ou inibir a agregação da forma anormal. Esses medicamentos são mais fáceis de produzir e administrar em comparação com os anticorpos ou terapias genéticas.
Alguns compostos, como o polissulfato de pentosano e a doxiciclina, foram testados em pacientes com resultados variados. Novas moléculas estão sendo desenvolvidas para se ligarem especificamente às proteínas priônicas e impedir seu mau dobramento. O design de fármacos auxiliado por computador e métodos de triagem de alta eficiência estão ajudando os cientistas a identificar compostos mais eficazes.
Esses medicamentos podem atuar tanto como ferramentas preventivas quanto terapêuticas, especialmente para pessoas com doenças priônicas hereditárias e alto risco de desenvolver sintomas no futuro.
Nanotecnologia para Entrega Direcionada
A nanotecnologia está desempenhando um papel cada vez mais importante na pesquisa médica, inclusive no tratamento das doenças priônicas. As nanopartículas podem ser usadas para entregar medicamentos, anticorpos ou material genético diretamente ao tecido cerebral, protegendo esses agentes terapêuticos da degradação.
Por exemplo, nanopartículas à base de lipídios estão sendo testadas como transportadoras para oligonucleotídeos antisenso ou fármacos de pequenas moléculas. Esses nanosistemas podem ser projetados para atravessar a barreira hematoencefálica e liberar sua carga no local da infecção, melhorando a eficácia do tratamento e minimizando os efeitos colaterais.
Pesquisadores também estão explorando formas de adicionar moléculas-alvo à superfície das nanopartículas para que elas se liguem especificamente às células infectadas por príons, oferecendo uma abordagem de medicina de precisão para o tratamento das TSEs.
Inteligência Artificial na Descoberta de Fármacos
A Inteligência Artificial e o aprendizado de máquina estão acelerando a busca por novos tratamentos para doenças priônicas. Sistemas de IA podem analisar grandes conjuntos de dados para identificar padrões, prever como as proteínas priônicas se dobram e simular como os medicamentos potenciais irão interagir com seus alvos.
Programas como o AlphaFold já revolucionaram o entendimento das estruturas proteicas. Com esses modelos, os cientistas podem entender melhor como os príons se dobram de maneira anormal e como projetar moléculas que previnam ou revertam esse processo.
A IA também ajuda no reaproveitamento de medicamentos existentes. Ao analisar bancos de dados de medicamentos conhecidos, os pesquisadores podem identificar compostos com propriedades antipriônicas, acelerando o caminho até os testes clínicos.
Olhando para o Futuro: Esperança à Frente
Embora ainda não exista cura para as TSEs, o cenário está mudando rapidamente. O que antes era considerado um grupo de doenças intratáveis agora está no centro da pesquisa científica de ponta.
Com novas terapias visando a propagação dos príons e ferramentas como edição genética, nanotecnologia e inteligência artificial progredindo rapidamente, o futuro oferece esperança real para os pacientes e suas famílias afetadas por essas condições devastadoras.
Conclusão
Este artigo explora os múltiplos caminhos da terapia de próxima geração que estão transformando nossa abordagem às TSEs, oferecendo novas possibilidades onde antes não havia nenhuma. À medida que essas inovações passam do laboratório para os ensaios clínicos, nos aproximamos cada vez mais de um tratamento eficaz — e talvez até da prevenção — das doenças priônicas.
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